Seis conselhos para elaborar um bom portfólio de investimentos

Felipe M Passero, CFA, LinkedIn, 26/03/2018

O assessor de investimentos é frequentemente abordado por investidores com a one million dollar question “qual a classe de ativos que trará mais ganhos nos próximos 12 meses?”. Ou as variantes: qual parcela do meu portfólio deve ser alocado em bolsa, quanto devo ter de exposição em ativos no mercado internacional e outras perguntas que devem ser respondidas levando em consideração as características individuais de cada investidor. Para tanto listei seis aspectos para a construção de portfólio.


1 — Liquidez


Uma estrategia de investimentos começa identificando as restrições de liquidez. Um projeto de uma compra de um novo imóvel, a educação dos filhos ou a previsibilidade da renda do investidor são restrições e sinalizadores de necessidade de recursos disponíveis no curto prazo.


2 — Capacidade e disposição de correr riscos


Decorre de aspectos como idade, ausência de dívidas, necessidades de liquidez, entre outros. Disposição de correr risco é um aspecto comportamental, que pode ser explicada pelo nível de conhecimento técnico do investidor, a origem dos recursos — um patrimônio herdado tende a levar a média dos investidor a ser mais avesso a risco que um patrimônio construído, e pelos estudos de tomada de decisão.


3 — Compreensão dos critérios de tomada de decisão


A teoria tradicional de comportamento dos investidores trabalha com três premissas básicas:


a) Aversão a riscos. Preferem menos risco dado um nível de retorno esperado


b) Expectativas racionais. Pesquisam e analisam todas as informações relevantes para a tomada de decisão.


c) Visão integrada de portfólio. Analisam não só um ativo ou uma classe de ativos, mas o risco e a correlação do portfólio como um todo.


Já a teoria das finanças comportamentais enumera três aspectos para a tomada de decisão de investimentos:


a) Aversão a perdas. Preferem uma perda maior incerta que uma perda pequena certa.


b) Expectativas enviesadas. Possuem uma confiança excessiva na sua habilidade de prever o futuro.


c) Segregação de ativos. Ao invés de analisar o impacto de um investimento no portfólio como um todo, investidores focam em ativos individuais.


Vejo também que certos investidores tomam decisões muito em função do passado, sem ponderar as probabilidades de risco e retorno de um determinado ativo ou classe de ativos dadas as condições atuais (e não passadas). Vale também ressaltar a influência do framing na tomada de decisão. A forma como um investimento é apresentado torna-se um fator decisivo para a tomada de decisão e para a percepção de risco.


Para ilustrar, um fundo imobiliário é um investimento lastreado em imóveis ou recebíveis de aluguéis de imóveis, com a diferença que podem ser vendidos com facilidade na Bolsa de Valores, seja com um preço maior do que o valor da compra (prêmio) ou menor (desconto). Já a compra de um imóvel também pode gerar retornos de aluguéis, porém a negociação é mais demorada e a venda leva mais tempo para ser feita. No imaginário popular, investir em imóveis é “seguro”, e investir na Bolsa de Valores, ainda que em fundos lastreados em imóveis, é “risco”.


Cabe ao bom assessor de investimentos fazer um trabalho de educação financeira junto a seus clientes para alinhar a capacidade de tomar riscos com a disposição, bem como auxiliar e fornecer ferramentas para que as escolhas sejam feitas de forma mais racional.


4 — Estabelecer objetivos de retorno


Estes parâmetros podem ser absolutos ou relativos. São exemplos de objetivos relativos: porcentagem do CDI, índice da bolsa ou inflação somado a alguma remuneração percentual. Na média, investidores visam se aposentar a uma determinada idade e obter uma determinada renda derivada de seu portfólio. Partindo desse pressuposto, os objetivos de retorno devem ser escalonados. O retorno de um portfólio na aposentadoria deve ser adequado a um risco menor que o portfólio de um investidor que está na fase de acumulação. Há maior capacidade de riscos na fase de acumulação que na fase de aposentadoria. É importante o investidor ter um retorno alvo real líquido, já descontados os efeitos da inflação e dos impostos.


5 — Calcular apropriadamente o valor do portfólio gerador de renda na aposentadoria


O investidor precisa ter, na sua aposentadoria, uma renda que seja capaz de custear seu padrão de vida. Para tal, o portfólio precisa ter um tamanho tal que consiga gerar, através do rendimento real líquido, uma renda compatível. A teoria financeira estabelece que este portfólio deve valer o equivalente ao valor presente da perpetuidade dos fluxos de caixa dos resgates na aposentadoria. Simplificando, o valor do patrimônio na idade da aposentadoria é o resultado da divisão dos resgates no período de um ano pela taxa de retorno real líquida do portfólio em um ano.


Se uma família gasta R$ 20 mil por mês, e o retorno real líquido na aposentadoria é de 2,5% ao ano, o portfólio no momento da aposentadoria deve ser de R$ 9,6 milhões, já que o valor presente da perpetuidade destes fluxos é R$ 240 mil / 2,5%.


6— Escolha de classe de ativos


Tal processo deve respeitar as restrições de liquidez e capacidade de risco, bem como os objetivos de retorno do portfólio no momento de vida do investidor.


Nesta etapa, o investidor deve considerar a correlação de retorno entre as classes de ativos. Quanto menor a correlação, menor a volatilidade dos retornos do portfólio como um todo.


Uma vez estabelecida a alocação macro de classes de ativos, ou seja, a porcentagem nas várias classes de ativos possíveis para alocação — ações, fundos multimercados, renda fixa, crédito, investimento internacional, investimento imobiliário, investimentos alternativos — cabe ao investidor decidir em quais ativos individuais ele deve investir dentro de cada classe de ativos.


O valuation consiste em precificar cada ativo e encontrar o valor que o investidor considera justo. É como comprar um imóvel. Uma vez decidido qual a parcela do patrimônio o investidor vai destinar ao imóvel, cabe encontrar o imóvel mais adequado que esteja barato — abaixo do preço de valuation —e que tenha uma boa perspectiva de valorização.


Felipe M Passero, CFA