Correlação (e porque é hora do Investidor familiarizar-se com ela)

Denis G Coelho, CFP®, LinkedIn, 24/06/2020
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A diferença entre 2 e 3 dimensões também se aplica aos investimentos


Não tem como não estar surpreso com os fatos recentes.


Com as continuadas quedas nas taxas básicas de juros em todo o mundo, pode-se observar fenômenos curiosos. Veículos da mídia especializada reportaram no último trimestre de 2019 (ou seja, nos últimos meses em que mundo ainda girava no eixo normal antes do Covid-19) que cerca de 25% dos papéis de renda fixa em todo o mundo estavam sendo negociados com taxas de juros negativas. Algo que começou de forma pontual pelo Japão da década de 90 (com as tentativas de mover uma economia estagnada), alastrou-se por todo o mundo com a injeção de liquidez dos bancos centrais. Até papéis de empresas passaram a ser negociados com taxas negativas.


São tempos estranhos, não há dúvida. Para o Investidor brasileiro, tão habituado com taxas altas sem muita necessidade de pesquisa ou de informação, a certeza de facilmente poder acumular recursos fugindo sem correr praticamente muitos riscos acabou. Tchau SELIC de dois dígitos, tchau 1% ao mês! As taxas brasileiras super elevadas também ofereciam uma atratividade extra ao dinheiro do exterior, o que ajuda a explicar a cotação do dólar relativamente contida até algum tempo atrás, apesar da habitual instabilidade política na Terra de Santa Cruz.


Toda esta mudança no cenário econômico obriga o Investidor a familiarizar-se com uma variável até então negligenciada pela grande massa de aplicadores e, infelizmente, por uma gigante parcela de profissionais do mercado. Sempre se pensou em rentabilidade, claro, e na volatilidade, que pode ser facilmente definida como uma medida estatística de dispersão das rentabilidades de um investimento ou índice de mercado.


Esta última passou a entrar no vocabulário comum. Tão difundido está seu uso que até alguns Investidores pouco experientes passaram a adotar seu simpático apelido (na verdade jargão de mercado no Brasil): vol. Pode-se medir a volatilidade de um só papel, com uma ação ou um FII, ou de uma carteira completa, com planos de previdência inclusive. A análise de rentabilidade histórica e a volatilidade são muito úteis para determinar, dependendo é claro de quanto no tempo conseguimos voltar, o risco de mercado de determinado papel ou carteira. Isto ajuda na hora de tentar montar uma posição com maior ou menor agressividade. Entretanto, há uma terceira variável que aí sim traz uma análise mais completa de toda a situação.


O coeficiente de correlação é uma medida estatística da afinidade entre os movimentos relativos de duas variáveis, ou seja, o quanto a rentabilidade de dois papéis, índices ou carteiras estão em sintonia. Os valores podem ir de -1,0 a 1,0. Qualquer valor menor que -1,0 ou maior que 1,0 indicam um erro de cálculo. Ela é de suma importância para ajudar em algo que todo Investidor conhece via ditado popular: nunca coloque todos os ovos numa única cesta. Conhecem o ditado, mas não o seguem.


Quanto mais próximo de zero menos correlacionados estarão os fundos, papéis, etc. quando comparados. Isto quer dizer que, olhando os dados históricos, os diferentes fatores que influenciaram os preços de um ativo não afetaram o outro. Quanto mais próximo de +1, mais andam juntos e quanto mais próximo de -1 mais constantemente vão em direção oposta (quando sobe um, baixa o outro). Como só é possível medir a correlação entre dois ativos, é necessário repetir este exercício para todos os ativos da carteira. É trabalhoso e nem todo profissional está capacitado a fazê-lo e interpretá-lo. Quando o Investidor somente mede a rentabilidade e a volatilidade, pode incorrer em um erro de interpretação muito grande. Por trás de uma rentabilidade razoável e de uma baixa volatilidade pode-se esconder uma correlação positiva (maior que zero e próxima a +1) elevada dos ativos, fazendo com que se movam na mesma direção, e aí numa mudança repentina do mercado os ganhos de vários meses vão por água abaixo.


A prática cotidiana me permite constatar que o Investidor, achando que tinha seus ovos em várias cestas diferentes (já que tinha aplicado em diferentes fundos de variados bancos ou corretoras diferentes), na verdade os tinha em poucas cestas, quando não nas mesmas. Isto porque, como o mercado nacional de ativos financeiros é, em geral, relativamente pequeno e pouco líquido, os gestores tendem a utilizar estratégias que compram os mesmos papéis (seja renda fixa, ações ou derivativos). Por isso também que, em momentos de alta turbulência de mercado, os fundos de investimento de uma mesma categoria sofrem majoritariamente da mesma forma. Todos andam na mesma direção. As exceções são aqueles gestores que fizeram algo de diferente. E pode observar, sempre um gestor diferente sai vencedor em cada situação de crise. Tudo o que o Investidor conseguiu ao achar que estava diversificando foi uma maior dificuldade em acompanhar sua carteira, especialmente se não conta com um profissional que possa ajudar a fazê-lo de forma integrada.


Diversificar efetivamente é olhar para os investimentos de uma carteira sabendo que há 3 variáveis principais: rentabilidade histórica, volatilidade e correlação. Não é fácil e requer ajuda profissional para isto. E mais, o horizonte de tempo deve ser amplo. 24 meses não contam história nenhuma. Há muita informação disponível, aquele Investidor que tiver interesse conseguirá assentar boas bases para seu patrimônio.



Denis G Coelho, CFP®